Comentário às duas primeiras medidas propostas PDF Imprimir e-mail
20-Jun-2009
A “desertificação” do interior das cidades não faz sentidoA minha experiência profissional diz que a melhor forma de ganhar o apoio de um grupo, de o unir em torno de uma ideia, não é dar a decisão, é explicar o porquê da mesma, assim, visto ter sido desafiado por um partidário vosso, decidi comentar as duas primeiras medidas propostas, tentei dar objectividade às ideias e onde a minha experiência e conhecimento me permite, dar uma ideia de operacionalização da ideia.
Contributo de Hugo Fonseca

1. Plano de emergência para a criação de emprego

Revogação do Pacote Laboral e da sua regulamentação, restabelecendo os direitos de contratação colectiva e reduzindo para 1 ano o período de contratação temporária.

Acredito que esta medida para ser viável tem de ser acompanhada de um forte apoio à contratação, estímulo para criação de auto-emprego ou de dar ferramentas às Micro Empresas para contratarem apoiadas em fundos para formação ou de outra forma que não penalize a criação de negócios.

Pode ser criado um instituto de apoio ao projecto de empresa, uma equipa de economistas/financeiros que trabalham para alguém que quer criar o seu negócio, produzem o plano de negócio e a forma de o viabilizar, aumentar os direitos dos trabalhadores nada resolve se reduzirmos a criação de emprego.

Criação de emprego e a redução da precariedade e pobreza, através de medidas anti-recessivas de apoio ao investimento, à formação profissional, em particular dirigidas a desempregados de longa duração e jovens nos distritos mais atingidos.

É uma frase interessante, mas como se faz? O que escrevi acima pode ser interessante, há um estudo essencial a fazer, tal como devem ser estudadas quais as necessidades globais de certas profissões e limitar as vagas universitárias em função das necessidades futuras e assim evitar futuros desempregados, o mesmo tem que ser feito no âmbito do trabalho, é essencial pensar qual a necessidade das produções ou serviços a 10 ou 20 anos e ver que há empresas que simplesmente não podem ser salvas e onde tem de se gastar o dinheiro não a salvá-las mas a criar alternativas para esses trabalhadores.

A criação de emprego por aumento do trabalho público está longe de ser uma ideologia que defenda, contudo em altura de crise como a que temos, pode ser parte da solução.

Os serviços de apoio ao investimento e à exportação, à internacionalização de empresas podiam viver com muito mais meios. Veja-se o exemplo das Oficinas Comerciales espanholas e veja-se o que é ter o estado a ajudar as empresas a crescer e a criar emprego onde as oportunidades existem, se for criada uma bolsa de jovens licenciados que as empresas portuguesas os possam contratar pagando parte dos custos para produzir estudos do seu interesse? Onde o direito aos mesmos é da empresa durante 6 meses e depois do estado para divulgar e potenciar mais investimento? Mais do que criação de empregos directos, esta é uma medida de emprego indirecta, onde se pode estudar formas de exportação, criação de emprego internacional, dá-se formação e experiência a jovens em ambientes internacionais, etc. Em que as empresas têm um meio "barato" para poder explorar oportunidades, o estado dá um tipo de formação profissionalizante que é inestimável para jovens qualificados e os retira de uma fila de desemprego sem estarem a produzir nada.

O que são medidas anti-recessivas de apoio ao investimento? O que será a formação profissional de desempregados de longa duração?

Imagino que não seja fácil criar soluções para pessoas com mais de 45 anos cujo saber pode ser ter passado 20 ou mais anos numa fábrica que fechou. Pode ser uma solução reavivar indústrias artesanais? Criar fundos de cultura que apoiem empresas non profit onde o objectivo é perpetuar a saber da nossa cultura? Quantos empregos uma campanha nacional destas pode criar? Vamos imaginar que se criam em média 5 empregos por freguesia para desenvolver produtos artesanais locais (a loja artesanal de cada junta de freguesia). Num país com mais de 4.000 freguesias estamos a falar de 20.000 empregos a produzir artesanato, que pode ser exportado, comprado pelas embaixadas e ICEP para feiras por esse mundo fora. Essas mesmas "lojas" podem dar formação gratuita que até pode ser comparticipada por fundos europeus.

Para os jovens a solução será menos fácil, é difícil admitir que o país não consegue gerar emprego para os jovens, mas no pós 25 de Abril também não o conseguia e os portugueses emigraram, foram procurar trabalho onde ele existia, hoje acontece o mesmo, o Brasil empresta dinheiro ao FMI, o crescimento está na América do Sul, em África e Ásia. Ao contrário do pós 25 de Abril, hoje temos jovens melhor qualificados, que podem ganhar mais em buscar um mercado global do que insistir no emprego ao lado de casa.

O mercado global não é expulsar as pessoas de Portugal, é criar mobilidade, um português tem uma limitação mental sobre o distanciar-se de casa que impede a busca de oportunidades, é essencial promover a discussão deste tema, de apresentar oportunidades não locais, de globalizar a busca de emprego dentro e fora dos locais de residência, é necessário levar as oportunidades aos jovens, sejam elas em Fafe, Vila Real de Sto. António ou no Brasil, China ou outro local.

Hoje há mais jovens a buscar o serviço militar pois existem empregos disponíveis, quais as funções onde podemos ter serviços militares profissionais a prestar serviços, prevenção e combate aos incêndios (cerca de 1500 empregos)? Socorros a náufragos (cerca de 4000 empregos comparticipados pelas concessões nas praias)? Estes dois temas (e talvez muitos outros) que todos os anos causam dissabores podiam ter equipas profissionais, treinadas e preparadas para todos os anos prestarem um serviço público de qualidade em vez de um franco amadorismo.

Outra forma de criar "emprego" é o de apoiar projectos de inovação, muitas vezes estes projectos podem ser em regime de voluntariado, por exemplo a criação de um departamento de inovação nas universidades, com o objectivo de não desenvolver estudos ou doutoramentos, mas sim tecnologia, dar oportunidade a profissionais desempregados de junto das universidades usarem meios de laboratório e outros que muitas vezes passam mais tempo parados que a produzir, para projectos de inovação, de criação de tecnologias ligadas à energia, materiais, biotecnologia, etc. Há tanto equipamento disponível e algum com muito pouca utilização.

Proibição de despedimento em empresas com lucros.

Como se previne o risco de fecho das empresas? De levarem a sua produção para outro local. Como se proíbe uma empresa de mudar a sua orgânica? Que empresas querem estar num país assim? Esta medida é das tais que tem de ser muito bem explicada, com um título destes nenhuma empresa quererá investir num processo sem contrapartidas sérias.

A grande medida é como se incluem os trabalhadores não nas reclamações mas na gestão da empresa, como se envolvem as pessoas de modo a que todas compreendam que o distanciamento entre administração e trabalhadores não faz sentido, que no mundo de hoje todos os meios têm de sentir para que estão a trabalhar, que o lucro não é o objectivo final mas a garantia de sobrevivência e do projecto da empresa pois o lucro é que paga o projecto, senão os empresários punham o dinheiro a render juros em vez de abrirem empresas.

2. Reorientação do investimento público para uma prioridade: reabilitação urbana

Os grandes investimentos são precisos a curto prazo onde têm efeito para combater a recessão: na reabilitação urbana, com a criação complementar de uma Bolsa de Arrendamento.

Sim, concordo em absoluto, é a minha área profissional e sem duvida que esse tipo de construção produz muito mais emprego directo de curto prazo que fazer auto-estradas e aeroportos, contudo reabilitação urbana é um tema que vai desde o arranjo do passeio até ao arranjo do monumento nacional, ou da rua até à criação de bairros sociais. Mais uma vez acho essencial definir objectivos.

Deixo o exemplo de Abu Dhabi, que está a criar uma nova cidade para 250.000 habitantes onde toda a energia virá de fontes renováveis, é um projecto megalómano, mas pensando no potencial que um projecto destes tem, das tecnologias que serão desenvolvidas para o mesmo, para o potencial de marketing que tem, do emprego directo e indirecto que vai produzir, só pode dar certo. Claro que ninguém refere a energia não renovável que vai ser consumida para o realizar, mas é a ideia que vale, não a forma de a atingir.

Hoje vivo fora de Portugal e vivo numa cidade decrépita onde encontro parques e equipamentos sociais com 30 anos como ainda não existem em Portugal.

Lisboa e Porto são cidades sem condições de expansão, essa condição levou ao crescimento em altura sem planeamento, que levam a custos de manutenção e reabilitação altos, comparados com cidades que consigam limitar o crescimento em altura a 3 ou 4 andares e que façam o seu crescimento em área.

Um modelo sustentado não é possível para as cidades existentes, mas é possível dar meios a novas zonas para crescer e serem centros urbanos novos em volta de novas infra-estruturas, o exemplo do novo aeroporto e da zona a Sul do mesmo são um bom exemplo de uma área plana, onde se pode investir de forma planeada, com custos controlados para uma cidade pensada em 2050 e não só a pensar no problema de hoje.

A "desertificação" do interior das cidades não faz sentido, não faz sentido que as habitações camarárias se arrendem por uma fracção dos valores de mercado e que sejam entregues aos amigos dos amigos. Mais uma vez contra a minha natureza, a alteração das leis poderia abrir o mercado, hoje o preço das rendas é alto pois o risco de não pagamento é alto e a forma de "despejar" um inquilino não é expedito. É um desincentivo ao arrendamento.

Mudar uma lei para mais regulação e maior justiça social, em que os valores de arrendamento estão tabelados em função da avaliação da habitação, idade e "amortização" do investimento da mesma, olhar o arrendamento como um negocio que pode ser bom para as duas partes, este tema levaria a que os donos tivessem interesse em reavaliar as habitações, deveria melhorar as condições médias das mesmas (criação indirecta de emprego em reabilitação urbana), traria também mais justiça à cobrança de IMT. Uma câmara ou um privado teriam as mesmas regras para alugar uma casa. Resolve a melhoria de regulação de preços de mercado ao legislar intervalos para os mesmos.

A forma de evitar o risco de não pagamento das rendas e assim incentivar o arrendamento a preços mais justos pode passar por ter o estado como fiador do inquilino, hoje em dia o estado tem mecanismos de ir cobrar coercivamente verbas que um privado não tem (nem deve ter), por exemplo, o Sr. António é inquilino do Sr. João. O Sr. António paga ao estado e o estado ao Sr. João (este pode ser um serviço prestado pelos bancos sem custos, como se tratasse de um factoring/conta ordenado sem risco pois o estado é fiador, onde o Sr. João até pode estar a acumular parte desse dinheiro e a ajudar à sua poupança).

O Sr. António atrasa-se a pagar uma renda ao banco, o estado paga ao Sr. João e passa a ser credor do Sr. António. Ao fim do ano, quando o Sr. António faz a sua declaração de IRS o estado em vez de lhe devolver dinheiro do IRS anula a divida + juros (justos) ou tem uma cobrança superior a fazer de IRS + juros, que passa a cobrar de forma coerciva como o faz hoje. O Sr. João arrendou a casa a preços de mercado, tem a casa avaliada e legal em relação à habitabilidade da mesma e não tem o risco de ter um inquilino que não lhe paga e que não consegue tirar da sua casa.

Para minimizar a "troca" de dinheiro e se o estado tivesse interesse, o banco em questão até poderia ficar "credor" do estado e reduzir aos impostos a pagar esse valor + juros (justos).

Nacionalização da energia para a mobilização de recursos que são de todos para todos.

Sou naturalmente contra, acredito contudo que tem de haver regulação, e não faz sentido que paguemos mais de energia que os países europeus com PIB per capita semelhantes ao nosso, é necessário entender qual o valor justo a pagar e obrigar o mercado a trabalhar para ganhar lucros dentro desses valores.

Nacionalizar a energia hoje, a banca amanhã, e depois os restantes grupos económicos, isso não é democracia nem politica para governação a não ser na antiga URSS.

Uma coisa é nacionalizar a energia enquanto negócio, outra é regular os recursos de forma integrada, e isso o estado não faz porque não quer pois tem empresas municipais e publicas suficientes e com autoridade para o fazer.

Hugo Fonseca

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