À esquerda, Educação rima com Cooperação PDF Imprimir e-mail
10-Mar-2009
Manuel GriloPrimeiro estranha-se, depois entranha-se, e quando damos por ela já damos como natural que a competição é o valor fundamental da vida em sociedade. Competição por uma vaga na creche, depois no infantário, depois na escola da zona, depois na secundária mais prestigiada para aquela área do saber, depois na faculdade, depois no estágio, depois no emprego, depois na vida, depois até na morte queremos que seja aquela funerária de prestígio.
Contributo de Manuel Grilo  

Arre, que é demais. Mais vale desistir já! Abaixo a competição. E pelo caminho, os vencedores que se derem ao trabalho de olhar para trás ou até para o lado vêem uma multidão que foi ultrapassada, que foi desistindo, que foi sendo triturada. Não ganhou nesta competição!

Na competição, a imensa maioria perde. Alguns, muito poucos, ganham tudo e tudo é demais.

Isto a propósito da Educação. Não vale a pena debruçarmo-nos sobre as pequenas coisas, as incongruências do sistema, as deficiências do aparelho que o tornam menos produtivo ou até menos competitivo (que raio de palavra), se não pudermos dizer primeiro que a Educação tem de se traduzir em Cooperação. Cooperação entre as pessoas, para as pessoas concretas, para que todos possam ter direito a alguma coisa que não seja demais mas que seja o suficiente. E no meio para que possamos ser todos felizes. No meio e no fim. Na escola e na vida e na vida da escola.

Como dizia um daqueles senhores que todos aprendemos a gostar em certa altura (agora já não sei...): "Façam o favor de ser felizes". E é isso que queremos, queremos ser felizes. Ser felizes sem ter de atropelar ninguém e sem ser atropelados.

Em cooperação, a escola tem de ser para todos e tem de ser com todos. À esquerda, o programa é para cumprir: igualdade, liberdade, fraternidade.

Para cumprir este programa temos de começar por questionar todas as verdades que em dezenas de anos nos inculcaram como verdades inquestionáveis. Não, não é verdade que mais eficácia corresponde a mais felicidade. Não é verdade. Mais eficácia significa simplesmente que demoramos menos tempo a fazer uma tarefa. Mas por que raio devo demorar menos tempo? Se a tarefa me der prazer por que não devo realizar essa tarefa em mais tempo?

Ensinar para o futuro. Qual futuro? Vejam nos filmes de ficção científica de há 20 anos. Alguém usava telemóvel nesses filmes? Alguém twitava? Como raio querem ensinar para o futuro? Aprendam o presente, o futuro vem sempre por acréscimo (é o bom do futuro, é sempre um ilustre desconhecido, e ainda bem, não queremos sofrer por antecipação).

Temos de ter objectivos definidos. Temos de ser rigorosos na avaliação. Com palermices deste tipo é que os bancos nos lixaram. Definiram objectivos aos bancários: impingirem-nos "produtos bancários". Pois, puseram-nos a todos de tanga. Para os bancários e os banqueiros atingirem objectivos, para ficarem bem na avaliação. Que se lixe a avaliação. Para que raio quero eu dinheiro que vou pagar com língua de palmo durante uma série de anos? E quando não puder pagar lixam-me .... Ou lixam-se se eu não puder, de todo, pagar. Esta dos objectivos individuais é mesmo de quem só navega em canais estreitos. Objectivos, não. Objectivo, sim - sermos todos felizes e sermos felizes uns com os outros.

Há lá melhor maneira de ensinar, e de aprender, e de ensinar a aprender, e de aprender a ensinar, que em cooperação? Com e não contra!

Lisboa, 10 de Março de 2009

Manuel Grilo é dirigente do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa

 
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