À procura da centralidade PDF Imprimir e-mail
20-Mar-2009
A política do BE está a passar pela aposta no interior. É uma luta difícilEm História ensina-se que Portugal é um país de mar e marinheiros. Mas este rectângulo à beira-mar plantado é algo mais. Para além do mar esconde-se um país de pessoas que durante gerações lutaram pela sua centralidade, pelo fim da distinção interior/litoral.
Contributo de Valter Alves

Portugal não seria o mesmo sem o interior - fulcral nas lutas independentistas e na defesa da nossa cultura. Ao longo de séculos em que a geografia se apresentava como um factor ostracista, a luta das populações passou pela procura da centralidade. «Portugal é Lisboa e o resto é paisagem» dizia Eça de Queiroz. Uma paisagem de grandes atributos e incansáveis lutadores que merecem o respeito devido a todos os portugueses e esquecido pelos sucessivos regimes e governos.

Políticas como o encerramento de maternidades e urgências com base em estatísticas e não nas reais necessidades das populações contrariam as ideias de respeito e igualdade que subjazem ao princípio da unidade nacional.

Persistimos no carácter periférico do nosso país, como se do nosso fado se tratasse. Paradoxalmente esquecemo-nos que o interior é geograficamente mais próximo da Europa e daí não sabemos retirar qualquer proveito. Cidades como Bragança, Guarda ou Portalegre estão mais próximas de Madrid, Paris ou Berlim do que qualquer cidade costeira. E esta centralidade do interior, quiçá essencial nos dias que correm, permanece nas águas do esquecimento.

Não existe um plano de investimento e desenvolvimento do interior. Apenas projectos avulsos, como coelhos sacados da cartola, para governos propagandearem que não se esqueceram do interior, quando as verdadeiras políticas perpetuam a rota do esquecimento.

Milhares de jovens procuram no litoral ou no estrangeiro as oportunidades que deveriam ter no interior. É esta a solidariedade de um país?

É necessária uma política para o interior que esqueça os votos (lá são menos) e pense nas pessoas (dignas de respeito). A transformação positiva do país tem de percorrer as zonas mais esquecidas. Sabemos que no interior os municípios são, sobretudo, dirigidos pelo PS e PSD. Sem retirar mérito aos autarcas que lutam pela melhoria das condições, a verdade é que sucumbem aos partidos a que pertencem e que, invariavelmente, têm estado no poder central. Se uma nova capacidade de intervenção política surgir no interior, os cidadãos ganharão uma voz forte, audível e intransigente na defesa dos interesses dos portugueses contra os poderes estabelecidos.

A política do BE está a passar pela aposta no interior. É uma luta difícil. Com excepção do Alentejo, o interior é dominado pelo PS e PSD e existe a ideia, até pelo poder dos sectores mais conservadores, de que partidos de esquerda não se conseguem implementar. Mas não é a luta pela existência de um Portugal mais livre e democrático que passa o movimento de mudança do BE? É preciso paulatina mas perseverantemente pugnar pela mudança que ultrapasse a mera retórica habitual.

Numa altura em que tanto se fala de investimento, este deve ser, em parte, canalizado para o interior no âmbito de um processo estruturado, pensado a médio/longo prazo. E esse investimento tem de passar pela melhoria e criação de infra-estruturas rodo e ferroviárias - e não é em megalómanos TGV`s que se está a pensar. Melhores hospitais, melhores escolas, descentralização efectiva de alguns serviços públicos são outros investimentos necessários. É imperioso o aproveitamento dos inúmeros recursos do interior. A aposta num crescimento sustentável, assente em energias limpas, numa investigação e indústria ecológicas, no turismo ambiental, na preservação do património histórico e natural e na diversidade cultural.

A fixação de pessoas no interior e o chamamento de outras só se alcança pela criação de melhores condições de vida e de trabalho. Não se está a defender a mendicidade do interior, nem qualquer desrespeito pelo litoral. Pelo contrário, Portugal só tem a ganhar e ganhamos todos um Portugal melhor.

Valter Alves

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