" Um Povo que não cuida do seu teatro, é um Povo amorfo e moribundo." (Garcia Lorca) PDF Imprimir e-mail
18-Abr-2009
Fresco do pintor brasileiro Oscar Pereira da Silva (1867-1939) no Teatro Municipal de São Paulo: "O Teatro na Grécia Antiga". Serviria também o seu propósito se em vez de teatro estivesse cultura. A questão sobre o investimento na cultura não está nem pode estar só ligada ao facto de estarmos em crise ou de estarmos perto de uma crise ou sequer de estarmos assim-assim. Esta discussão é sempre adiada e há sempre algo mais prioritário que se pode colocar à frente. É certo que há pessoas a viverem com imensas dificuldades, há desemprego e haverá sempre problemas que podemos relativizar em relação à cultura.

Artigo de Pedro Ferreira


O acto cultural está presente na maioria das nossas acções quotidianas. Uma das características fundamentais dos nossos tempos é estarmos submersos numa cultura de massas. A cultura de massas é hegemónica. A introdução desta nova forma de cultura em todos os âmbitos da vida quotidiana e em todos os sectores sociais substituiu as formas de cultura que até agora, tempos contemporâneos, existiam.

Estamos perante uma sociedade da comunicação, um mundo cada dia mais mediático em que o poder está cada vez mais do lado da informação e não do dinheiro. Assistimos a um novo protagonismo tanto económico como ideológico por parte das indústrias da comunicação e a sua aplicação aos sectores de produção cultural.

Tendo em conta a situação portuguesa e os orçamentos executados nos últimos anos, é óbvia, a emergência e o desenvolvimento do mecenato cultural de empresa nas sociedades modernas decorre da presença e articulação de um conjunto de condições e factores de ordem social e de uma convergência histórica particular, envolvendo, fundamentalmente, responsáveis pelas decisões nas empresas capitalistas, agentes culturais e Estado.

É sabido, sobretudo nos países da Europa ocidental, o desenvolvimento do mecenato empresarial permitiu a instauração de relações de proximidade entre os sectores público e privado, fomentando o aparecimento de parcerias, por muitos consideradas fundamentais ao desenvolvimento cultural nas respectivas sociedades. Enquanto ao Estado se reconhece uma responsabilidade social directa, às empresas não se reconhece uma necessária obrigatoriedade de actuar. Estas podem dar o seu contributo, mas não são associações culturais nem filantrópicas, pagam os seus impostos, não devem substituir-se ao Estado, sendo que o melhor é o Estado ser parceiros indirecto destas empresas no desenvolvimento cultural dos projectos da sociedade em que estamos inseridos.

O Estado deve ser sustentáculo e propiciador de condições para a intervenção das empresas. Trata-se de uma responsabilidade fundamental do Estado. As empresas podem intervir, mas em condições que deve ser o Estado a definir de uma forma negociada com estas mesmas. Vivemos em tempos de acelerado desenvolvimento, tempos em que as possibilidades tecnológicas se desenvolvem a um ritmo assustador. Se não quisermos deixar-nos dominar pela máquina ou degenerar numa massa

informe, é preciso uma rápida adaptação também ao nível social, feita com perspicácia e conhecimento. Assim e perante o aumento da mobilidade das populações, as subculturas ocupacionais socialmente estratificadas e o cruzamento de fronteiras entre vizinhanças revelar-se-iam mais importantes para a integração social global do que as antigas comunidades de vizinhança.

Porém, a mudança de gerações não ocorre num ambiente estático, mas coincide com transformações institucionais de vulto. Assim, são de registar entre outras, a secularização das relações sociais, o aumento da riqueza material, a transformação do trabalho, a cultura de consumo e a mediatização da cultura. As rotinas culturais consolidadas encontram-se agora em debate tanto entre pais e filhos, pais e professores, professores e alunos e entre vários níveis de funcionários de serviços para as comunidades e a própria comunidade em si. Neste contexto as instituições sociais públicas funcionando na base de uma participação responsável dos cidadãos, assumiriam as funções outrora atribuídas à família e à escola.

A concorrência entre cidades tanto pela tentativa de atrair população como capitais e investimentos tem vindo a alargar-se graças à redução de barreiras de comunicação que tornam estas disputas cada vez mais intensas. Publicitar a cidade trata-se sem dúvida de uma forma vantajosa de "vender" através da imagem os produtos e serviços que esta mesma poderá ter para oferecer. Assim factores como a cultura (processos de criação/ execução), a história da cidade (património arquitectónico) e as tradições (festas/ romarias/ feiras) são normalmente uma boa imagem para publicidade. É pois neste factor que a actual política cultural da cidade falha redondamente porque é incapaz de produzir eventos que "pequem" pela sua particularidade local dando preferência a eventos de carácter global e aglutinadores de pessoas... mas o que fica para além do evento em si? Nada. É essa a resposta que as entidades e as pessoas que tentam promover formação de públicos nesta cidade mais ouvem.

Abril 2009


 
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