Os idosos portugueses - a pobreza e a doença
23-Jun-2009
Nestes últimos dias, o Observatório para a Saúde veio revelar alguns resultados dos seus estudos, que, para a maioria dos cidadãos que se confrontam com dificuldades a todos os níveis, não constituem nenhuma novidade.
Contributo de Maria Clara Andrade

Um dos dados revelados, é que os serviços de saúde não respondem de forma satisfatória às necessidades da população. Outro dos resultados, é que os idosos portugueses estão em 4º lugar dos mais pobres da Europa.

Reunindo estes dois resultados, é muito fácil chegar à desgraçada conclusão das condições em que vivem os nossos idosos e suas famílias. Por um lado, como é sobejamente conhecido, a esperança de vida é cada vez mais longa, quer para homens, quer para mulheres. Por outro lado, esta esperança de vida cada vez mais longa, está cada vez mais afastada de ser uma longa vida com alguma qualidade.

Sabe-se que as doenças degenerativas, como por exemplo a Doença de Alzheimer e outras doenças que normalmente desencadeiam sintomas de estados de demência severos (com todas as consequências que daí advêm), estão a atingir números assustadores também no nosso país. Desta forma, é cada vez maior o número de idosos com idade muito avançada, com quadro de doença associada, em estado de total dependência, cujas famílias não têm capacidade de resposta. A ausência de recursos económicos, a inacessibilidade aos cuidados necessários a prestar a estes idosos, ausência de condições de outra ordem como condições físicas e psicológicas, deixam as famílias totalmente desprotegidas no apoio que necessitam de prestar aos idosos doentes.

E mais uma vez, se atribui a responsabilidade às famílias. Estas, muitas vezes acusadas de abandonarem os seus idosos nos hospitais, na maioria das vezes não têm qualquer recurso para cuidarem de idosos acamados que necessitam de todos os cuidados que não podem dar. O Estado (Governo e algumas autarquias), vêm propagandear medidas de apoio aos idosos que na prática não existem:

  • Os cuidados continuados prestados em unidades de internamento, são cuidados temporários e sem continuidade, mesmo sendo a lei 101/2006 clara quanto à possibilidade de "internamento permanente quando o doente não tem possibilidade de ser cuidado no domicílio". As unidades de internamento, mesmo as de longa duração e manutenção (que são escassas para responder às necessidades), ao fim de algum tempo, dão alta aos doentes, bastando para isso que estejam num estado de saúde considerado estável e que não apresentem "escaras".

  • Os cuidados continuados prestados no domicilio, são serviços cada vez propagandeados como sendo a solução, mas não resolvem de duas formas: não têm capacidade de resposta para quem necessita destes cuidados; não resolve as situações de falta de condições domiciliárias.

  • As instituições designadas "sem fins lucrativos" - as IPSS, que apesar de na maioria dos casos serem subsidiadas pelo Estado, não respondem às necessidades das comunidades, ora porque não têm vagas para todos, ora porque não recebem idosos em determinadas condições de saúde e sobretudo se o valor da pensão for ínfimo. Em alguns casos recusam-se a aceitar inscrições mesmo para as intermináveis listas de espera.

  • Os lares da terceira idade existentes, sendo privados, são obviamente acessíveis apenas a uma minoria da população. Muitas vezes sem as mínimas condições exigíveis e cobrando preços verdadeiramente escandalosos, esta não é a solução possível para a maioria dos idosos e suas famílias atendendo aos rendimentos que lhes são atribuídos neste país (pensões de reforma e salários vergonhosos).

Em conclusão, a situação da maioria das famílias, já tão sobrecarregadas de dificuldades de toda a ordem, é efectivamente de grande desespero. Com dificuldades para educarem e criarem os filhos e muitas vezes estas situações servem de argumento ao Estado para que lhes sejam retiradas as crianças e colocadas nas instituições. Paradoxalmente, o Estado é a primeira instituição a abandonar os idosos doentes deste país. Escorraça-os da sociedade mantendo-lhes a situação de miséria e não atribuindo às famílias qualquer tipo de apoio, nem mesmo para os casos mais dramáticos. É assim, desta forma, que continuaremos vergonhosamente no ranking da Europa como o povo mais pobre e com os doentes em situação de maior precariedade, sem solução para o será a curto prazo, o maior problema da sociedade portuguesa - a doença e os idosos mais pobres da Europa.

Maria Clara Andrade

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