Contributo sobre Sociedade de Informação
26-Jun-2009
Considero que o Bloco podia prever algumas medidas no domínio da Cidadania na Sociedade da Informação e do Conhecimento, área que tem vindo a assumir crescente protagonismo a nível internacional. No fundo, | encarar a Internet e suas potencialidades como instrumento de cidadania incontornável nas sociedades contemporâneas e que, como tal, merece que algumas políticas políticas nela se centrem.
Contributo de João Ricardo Vasconcelos

No âmbito da iniciativa "Políticas de Igualdade - um debate linkado ao país", apresento o contributo em anexo para o Programa Eleitoral do Bloco de Esquerda para as eleições legislativas de 2009. Centrei-me na área das políticas para o desenvolvimento da Sociedade da Informação e do Conhecimento, domínio onde actualmente se enquadram as minhas funções profissionais.

Verifiquei que a proposta de programa disponível possui um capítulo dedicado à Sociedade da Informação e da Cultura (pág 121). No referido capítulo, algumas temáticas centrais são abordadas como o software livre ou os direitos de autor na sociedade da informação.

Considero no entanto, que o Bloco podia prever algumas medidas no domínio da Cidadania na Sociedade da Informação e do Conhecimento, área que tem vindo a assumir crescente protagonismo a nível internacional. No fundo, encarar a Internet e suas potencialidades como instrumento de cidadania incontornável nas sociedades contemporâneas e que, como tal, merece que algumas políticas políticas nela se centrem.

Neste sentido, elaborei a proposta em anexo como possível sub-ponto 7 do capítulo Sociedade da Informação e da Cultura. A falta de tempo impediu-me de amudurecer um pouco mais este contributo. De qualquer modo, julgo que mesmo assim poderá ajudar a enriquecer o programa eleitoral do Bloco.

Lisboa, 25 de Junho de 2009

João Ricardo Vasconcelos

(Aderente n.º 7238)

Cidadania na Sociedade da Informação e do Conhecimento

Com o lançamento da Estratégia de Lisboa em 2000, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC), nomeadamente a Internet, foram reconhecidas como domínio central a merecer a intervenção de políticas públicas. A nível comunitário lançaram-se amplos planos de acção nestes domínios1, com conjuntos de compromissos e políticas a desenvolver: do desenvolvimento de infra-estruturas de banda-larga à modernização administrativa através do Governo Electrónico, da promoção do Comércio Electrónico ao impulso à inovação através das TIC. A nível nacional, os diversos governos têm acompanhado a referida tendência2.

No entanto, os esforços políticos desenvolvidos têm sido sobretudo direccionados para o desenvolvimento de uma economia baseada no conhecimento. Ou seja, mesmo quando beneficiam directamente os cidadãos, as políticas públicas têm sido desenhadas sobretudo com o objectivo último de torná-los como peças competitivas no seio de uma economia global.

Neste contexto, afirma-se como fundamental colocar os cidadãos no centro das políticas para a Sociedade da Informação. Encarar as TIC, nomeadamente a Internet, enquanto instrumentos de uma cidadania mais informada, mais activa e mais participativa. Será esse o objectivo central do Bloco nestes domínios.

Para o efeito, prevemos as seguintes linhas de actuação prioritária: 1) Acesso à Internet; 2) Competências em TIC; 3) Acesso livre ao Conhecimento; 4) Administração Pública Aberta e; 5) Democracia Electrónica.

1 - Acesso à Internet

A possibilidade de aceder com grande facilidade à Internet a baixo custo ou de forma gratuita até, impõe-se como objectivo central numa sociedade que se quer da informação e do conhecimento. Um recurso como a Internet tem de poder ser acessível a todos, sem restrições. Para o efeito, devenvolver-se-ão políticas que permitirão facilitar ao máximo tal acesso quer no espaço público, quer em casa.

A nível de espaço público, duas iniciativas centrais impõem-se:

  1. Alargamento e dinamização da rede de postos de acesso público à internet. Especial atenção será concedida à actual rede nacional de Espaços Internet3 (mais de 1100 espaços distribuídos pelo território nacional). Assegurar o alargamento da referida rede e a sua efectiva articulação com os meios onde se insere afirma-se como objectivo central.

  2. Fomentar o desenvolvimento do acesso gratuito à Internet sem fios em espaços municipais como jardins, bibliotecas, centros de dia, espaços juvenis, entre outros), nomeadamente através dos projectos Cidades e Regiões Digitais4.

No que diz respeito ao apoio no acesso à Internet em casa:

  1. Desenvolvimento de programa de atribuição de computadores com ligação à Internet a preço reduzido para públicos com baixos rendimentos. O referido programa deverá assim procurar atingir sectores da população tipicamente vitimas de info-exclusão, nomeadamente: idosos, imigrantes, cidadãos beneficiários do rendimento social de inserção e agregados em geral com baixos rendimentos. O referido programa deverá englobar acções de formação em TIC.

  2. Promover um programa nacional de recolha, reciclagem e redistribuição de material informático, desenvolvendo uma rede de recolha e tratamento de material considerado obsoleto pela Administração Pública e empresas, mas que ainda poderá ser utilizado por agregados familiares ou organizações não governamentais para efeitos de acesso à internet.

2 - Competências em TIC

Para que os cidadãos possam usufruir plenamente de uma ferramenta como a Internet, não basta apostar na massificação dos meios de acesso. Tão ou mais importante do que o acesso, é a aposta na utilização. Importa assim promover fortemente a formação de competências que permitam aos cidadãos usufruir plenamente de todas as potencialidades das TIC, nomeadamente da Internet. Neste contexto, destacam as seguintes prioridades de acção:

  1. Desenvolver um amplo programa nacional de formação de competências TIC na óptica óptica do utilizador. Baseado num referencial de formação comum, modelar e sequencial, acordado entre organismos públicos com competências nestas áreas e que mereça também a participação de organizações da sociedade civil, o referido programa constituir-se-á como ferramenta política central de massificação das competências TIC e de consequente combate à info-exclusão a nível nacional.

  2. Com base no programa acima, promover iniciativas de formação e certificação de competências na óptica do utilizador para os mais diversos públicos-alvo recorrendo às várias redes públicas (Escolas, instituições do ensino superior, Espaços Internet, Espaços da FDTI, entre outros.) Estruturar-se-ão também parcerias sólidas para o desenvolvimento de acções de formação e sensibilização junto de redes sociais com ampla experiência no terreno (Juntas de freguesia, Santa Casa da Misericórdia, Direcção Geral dos Serviços Prisionais, ACIDI, Universidades de Terceira Idade).

  3. Promover o voluntariado para a formação na Sociedade da Informação, através de programas de bolsa de horas que prevejam, por exemplo, a partilha de conhecimentos nesta área entre públicos tipicamente info-incluídos (e.g. jovens) e públicos tipicamente info-excluídos (e.g. idosos). O envolvimento das autarquias locais assume-se como central para a estrturação da referida iniciativa.

  4. Criar um Portal das Competências TIC, espaço direccionado para a disponibilização de formação TIC em modelo de e-Learning. Com conteúdos direccionados para diversas tarefas correntes (e.g. Navegação na Internet, processamento de texto, apresentações electrónicas) e com um formato bastante user friendly, o portal assumir-se-á como espaço de conhecimento onde qualquer cidadão se dirigirá para adquirir as mais diversas competências TIC na óptica do utilizador.

3 - Acesso livre ao Conhecimento

O acesso fácil, gratuito e quase sem limites ao conhecimento é uma das maiores possibilidades concedidas pela Internet. E a multiplicação de conteúdos online possibilita que o manancial de conhecimento já hoje disponível na Web seja inquantificável. No entanto, a universalidade de acesso possibilitada pela Internet impõe que se articulem esforços públicos acrescidos para partilhar conhecimento que ainda não se encontra online, nomeadamente nos seguintes domínios:

  1. Forte impulso à constituição e dinamização de repositórios académicos online em todas as instituições de ensino superior, permitindo que toda produção de conhecimento cientifico esteja disponíveis online. Dos trabalhos de licenciatura às dissertações de mestrado e teses de doutoramento, passando naturalmente por artigos publicados em revistas nacionais e internacionais e relatórios de projectos de investigação financiados, tudo deverá estar disponível para consulta online (com a devida autorização dos seus autores).

  2. Desenvolvimento de programa nacional de digitalização e disponibilização online de de obras cujos direitos de autor tenham caducado, reforçando-se decisivamente o esforço que tem vindo a ser feito nestes domínios por entidades como a Biblioteca Nacional. Para o efeito, a formação de um programa de voluntariado para a digitalização dos referidos materiais será uma das linhas de acção.

4 - Administração Pública Aberta

O forte desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação impulsionou uma forte modernização da administração pública em Portugal. Programas e iniciativas diversas colocaram Portugal numa boa posição nos rankings internacionais existentes neste domínio. No entanto, se muito foi feito em termos de reforma e flexibilização de processos, muito ainda continua por fazer no sentido de impulsionar a trasnparência da Administração Pública, possibilitando a sua efectiva monitorização e acompanhamento por parte dos cidadãos.

Nos nossos dias, a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos5 possibilita já que qualquer cidadão possa, por exemplo, dirigir-se a um serviço público e solicitar documentação tão diversa como documentos referentes a contratações públicas, planos e relatórios de actividades, entre muitos outros. No entanto, se tal já é formalmente possível através de uma solicitação formal de um cidadão, porque é que a Administração Pública não é proactiva na disponibilização da referida documentação online?

Neste sentido, visando uma progressiva transparência na Administração Pública e a sua maior proximidade com os cidadãos, as seguintes medidas deverão ser desencadeadas:

  1. Desenvolvimento de um Livro Branco para a Administração Pública Aberta. Elaborado de uma forma abrangente, envolvendo os parceiros sociais, a academia e organizações da sociedade civil com efectiva competência nestas áreas, o documento deverá sintetizar uma série de princípios e compromissos em termos de disponibilização de informação online pela Administração Pública.

  2. Após o processo de articulação acima, delimitação de um conjunto de documentação que cada organismo da administração pública deverá obrigatoriamente disponibilizar online de forma inequivoca. Desde orçamentos anuais às mais diversas contratações públicas por exemplo, o máximo de informação deverá estar online para verificação dos cidadãos.

  3. Desenvolvimento de mecanismos e procedimentos obrigatórios de auscultação dos cidadãos por parte de todos os organismos públicos. Embora não baseados exclusivamente no online, diversas ferramentas poderão ser aí disponibilizadas com vista a facilitar a emissão de contributos, opiniões, queixas e outros inputs por parte dos cidadãos

5 - Democracia Electrónica

Se até há uns anos atrás a barreira espácio-temporal implicava que os cidadãos não se pudessem envolver com grande facilidade nos processos de decisão pública, as tecnologias da informação e da comunicação, nomeadamente a Internet, vieram fornecer meios que permitem uma muito mais activa participação dos cidadãos. Das consultas públicas online, aos fóruns de discussão, passando pela transmissão de reuniões de carácter público ou pelo voto electrónico à distância, muito pode hoje ser feito para aproximar de facto os responsáveis públicos aos cidadãos.

As TIC disponibilizam hoje instrumentos à democracia inimagináveis há apenas uma década atrás. O seu não aproveitamente constitui, neste sentido, um desinvestimento na qualidade da democracia. Neste contexto, três projectos assumem-se como prioritários:

  1. Criação do Portal da Democracia, espaço onde os responsáveis políticos (governantes, deputados, altos dirigentes da administração Pública) e os cidadãos terão ao seu dispor as mais diversas ferramentas para interagirem Desde espaços de consultas públicas online, até chat rooms sobre temas específicos, passando por informação sobre a agenda dos responsáveis ou até as mais modernas ferramentas disponibilizadas pela Web 2.0, tudo deverá ser feito para que o portal seja o Ágora da política portuguesa.

  2. Desenvolvimento de Software de Democracia Local e sua disponibilização a Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia. O referido software de patente pública deverá poder dotar os websites das autarquias locais portuguesas interessadas dos mais diversos mecanismos de auscultação dos cidadãos. Desde consultas públicas a locais de pergunta e resposta ou à possibilidade de transmissão de reuniões públicas, as autarquias poderão aceder a um pacote de ferramentas que impulsionará a democracia local.

  3. Estudar a possibilidade de adopção de mecanismos de voto electrónico à distância em Portugal. Assegurando-se elevados requisitos de segurança e confidencialidade, a possibilidade de exercer o voto à distância de forma electrónica (e.g. pela Internet, por telefone, por sms) poderá constituir-se como contributo decisivo para diminuir a abstenção eleitoral em Portugal. Dada a dimensão das suas possíveis mais valias, este será um domínio que deverá ser devidamente estudado e analisado.

 

Referências

Documentos Programáticos Europeus

  • Estratégia de Lisboa

http://www.consilium.europa.eu/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/pt/ec/00100-r1.p0.htm

http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2005:0229:FIN:PT:PDF

Documentos Programáticos Nacionais

http://www.epractice.eu/files/media/media_392.pdf

  • Plano de Acção para a Sociedade da Informação

http://www.umic.pt/images/stories/publicacoes/I_Plano_Accao_SI.pdf

  • Plano de Acção para o Governo Electrónico

http://www.umic.pt/images/stories/publicacoes/II_Plano_Accao_eGov.pdf

  • Plano Tecnológico

http://www.planotecnologico.pt/document/OPlanoTecnologico.pdf

  • Ligar Portugal

http://www.ligarportugal.pt/pdf/ligarportugal.pdf

1 eEurope 2002, eEurope 2005 e i2010 (ver referências no final da presente proposta).

2 Livro Verde para a Sociedade da Informação, Iniciativa Internet, Plano de Acção para a Sociedade da Informação e Plano de Acção para o Governo Electrónico, Plano Tecnológico e programa Ligar Portugal (ver referências no final da presente proposta).

3 www.rededeespacosinternet.pt

4 http://www.cidadesdigitais.pt/

5 Lei n.º 46/2007 de 24 de Agosto (http://ec.europa.eu/information_society/policy/psi/docs/laws/portugal/pt_transposition_law.pdf

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